É hoje que ele sai desse lugar! Vai aproveitar
o carnaval pra sair do armário!
Peruca
loira, batom vermelho, make transada, glitter
na pele, um shape bem trabalhado na academia, e em cima do salto. Tudo isso para
sair na avenida distribuindo confetes, serpentinas, amor e alegria. Ao se olhar
no espelho, diz ao seu próprio reflexo:
-Hummm...Amei! Superei minhas expectativas! -
borrifou no ar o perfume, e passou por ele com tudo. Sentiu-se pronta para cair na folia, e na sua
colorida realidade.
A avenida virou passarela. Alguns olhares fixos lhe davam mais confiança.
Seu coração batia no ritmo dos tambores. Estava ansiosa por esse dia. Dia de assistir
ao desfile das escolas de samba no camarote da agência. Enfim, seus colegas de
trabalho iam conhecer o verdadeiro José Roberto, a Roberta Maria. Roma para os íntimos.
-Genteee! - foi
o abre-alas escolhido pela estagiária quando o avistou na entrada - Olha o Zé Robert...
-Hey,
girl! - gritou a mais nova foliã - Eu
sou Roberta Maria! Mas podem me chamar de Roma - e foi pegando um drinque, que
virou de vez.
- Uauu! Quem tem boca vai à Roma! – disparou sem
graça com a falta de criatividade o César, redator da agência, que estava de
bombeiro.
- Sim, quem tem boca pode chegar chegando aqui, que
essa Roma tá bem facinha!
- Oh, baby! – reagiu o bombeiro, lhe sorrindo e dando
uma piscadinha.
De cropped verde e sainha rosa, Roma estava toda prosa.
Era tão bom se sentir aceita. Muitos ali já desconfiavam, mas nunca lhe
faltaram com o respeito. E ela nem estava preocupada com os outros. Só queria poder
ser ela mesma.
José Roberto já tinha reparado no seu parceiro de job,
mas naquela noite, ele estava muito mais interessante. Vai ver era só coisa de
carnaval. Seria mesmo só isso?
Do nada, flashes do dia a dia na agência foram jogados
na sua cara como confetes coloridos: os cafezinhos sempre a sua espera, assim
como o jornal sempre a postos, os convites ao cinema, os tantos encontros por
acaso no banheiro, onde trocavam piadinhas, os esbarrões frequentes. Almoços
ali por perto da agência, com discussões saborosas sobre os mais variados
assuntos, brincadeiras com as palavras, as caronas de volta pra casa... Junto
com essas lembranças que vieram à sua mente, mexendo tanto com o seu coração,
veio também uma inevitável pergunta: “ Será que o César também é?”
Outra piscadinha desse bombeiro, e ela não vai
resistir!
Alguém chama toda a equipe da criação pra fazer selfie,
e ao chegar perto do colega, Roma até se arrepiou. A coisa esquentou quando depois
de encará-la, César piscou novamente.
Nesse momento, Roma tirou o bombeiro pra dançar, e ele
meio sem jeito acabou aceitando o convite. Os dois deram um show. E não
importava o ritmo, eles acertavam todos os passos. Incrível como essa parceria deu
match também no samba!
-E esse fogo todo, não se apaga nunca? – quis saber César,
ao ver que o antigo e agora mais nova colega estava derretendo.
-Depende desse bombeiro aí... - intimou Roma.
E antes que César
repetisse a piscadinha , ela lhe roubou um beijo, que foi, sem medo, muito bem
correspondido.
José Roberto extravasou o que tinha guardado
durante aqueles vinte e nove carnavais. O corpo que antes tentava controlar, dava
lugar a outro que fez o que sempre desejou fazer. Sambou, rebolou, sentou, galopou,
jogou charme, gargalhou, cantou, falou sem temer com o tom de voz que gritava
dentro dele, voz que sempre quis usar.
- Hey, César! Você já viu o que é Roma
ao contrário?
- Roma ao contrário, como assim? Ah, a-moR?
- Sim, meu amor! – declarou-se Roma, agarrando e beijando novamente o seu amor de
carnaval, que, quem diria, já o havia encontrado no trabalho. E agora, José?
De volta ao expediente, César vai cantarolando pelo
corredor da agência, lembrando do surpreendente e quente carnaval que curtiu. Passa
pelo seu colega dando a sensual piscadinha. E Roma já fica imaginando como vai
pegar fogo a noite daquela quarta-feira de cinzas...
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