Saturday, January 15, 2022

Jardim de inverno




“Mudaram as estações, nada mudou...”

No frio, as flores dormem. E despertam belezas diferentes das que são vistas na primavera: Girassóis semsóis, rosas marrons, árvores secas, cheias de galhos agora sem nenhum sinal de folhas, de vida. São veias onde não correm cores, mas onde a lua quando aparece através delas, brilha ainda mais. O sol consegue surgir, não tão forte a queimar, mas chega sim a iluminar.

A frieza se faz presente e é insistente, independe de estação. Está também nas trocas, que não se dão. E nos contatos, sem tato. Um jardim de mim, com espinhos a flor da pele, a ferir, e a fé ri. Um solo fértil a ser semeado mas que só nasce, quando se esquece. Quando enfim, o frio se disfarça, e com máscaras floridas, aquece.

Inverno também pode ser colorido. E ter dias mais quentes. Basta saber pintar o quadro de uma fria realidade usando os pincéis da fantasia, da imaginação. Do Zoom das reuniões.

Inverno é uma estação para ensinar a acalmar, a abdicar, a transformar. Uma estação que também traz flores: as mais fortes, mais elegantes, mais persistentes e inteligentes.

No frio, jazem em mim, dores que dormem. Jasmins de uma infância a reflorescer e a perfumar. Jasmins perfumando o ar com o cheiro das minhas avós, Alma de flores, Rastros de Alfazema Suissa... Infância que me traz o ler, escrever, cantar e dançar. Infância que me traz vozes.

Plantando árvores, já saboreando possíveis frutos. A querer deitar e rolar, feliz, nas minhas sombras.

Com as folhas no chão, ou já não, a aprender. Pelas flores, que, lindamente virão, a pacientemente esperar. Ao olhar para o outro, entender, traduzir as suas raízes e aceitar, amar.

 Deixar de estar plantada e andar, para assim me conhecer, me reconhecer, me identificar. Para assim, crescer, alcançar o tão difícil adaptar. Um outro enraizar. Com o adubo do sofrer.

Lágrimas, mágoas, a cuidar de um jardim. Jardinverno, primas que verão. Primavera, verão, outono... Ou nada.

A paixão, abdicada. E assim, imortalizada.

Histórias a se viver. Histórias a se contar. A se imaginar. E a ferir. E a fé ri. E a felicidade com a saudade, no meu peito ainda mora. Amora, mangaba, goiaba, maracujá, pitomba, umbu, cajá, caju...

A vizinha de frente, olha o seu jardim e decide seguir em frente. Enfrente!

“Quem tem flores, dá flores”. “Vejo flores em você”. “Estátua majestosa do amor”. “Simplesmente, as rosas exalam o perfume que roubam de ti.”

Às vezes o solo não permite, e a flor resiste. Em nome de um jardim, em nome de espinhos, a ferir, mas a fazer feliz. Semente de um outro país. Bonito por natureza.

A flor de uma pele a sentir. Sem ti. Sem raiz. Retirada, extraída. Dividida. Despetalada. Replantada. Reproduzida. Abdicada. Abduzida.

Dos trópicos a tropeçar, a cair... Pau que nasce torto, sim, se endireita.

Um tronco, mesmo torto, tem sim a sua beleza.



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